Agora resolve esse problema! ARP #1 – Uma falha na raqui após falha de peridural
02/02/2023 | 15:34
02/02/2023 | 15:34
Apesar de uma taxa menor dessa complicação em mãos experientes, ela pode ocorrer independente da experiência do profissional. Esta situação após ver a gratificante imagem de retorno de LCR através da agulha pode ser frustrante e levantar várias dúvidas:
Houve perda da punção?
Houve falha na injeção do anestésico?
Será que não ocorreu adequada difusão do anestésico no LCR?
Talvez uma ação inadequada da medicação?
Seria uma característica relacionada ao paciente?
Todas essas questões devem e podem existir. Veja o caso a seguir.
Paciente jovem do sexo feminino, diabética, primigesta; recebe uma analgesia de parto com anestesia peridural. Durante 2 horas a anestesia funciona perfeitamente, mas após movimentação importante para posicionamento para passagem de cateter de Foley ela se torna ineficaz. A peridural foi realizada sem dificuldades, com introdução do cateter 3cm no espaço. As contrações se tornam mais dolorosas e frequentes e você se prepara para checar a posição do cateter, quando o feto começa a apresentar desacelerações à cardiotocografia. A paciente então é levada ao centro cirúrgico para parto cesariano.
Você se prepara para realizar uma raquianestesia no mesmo espaço da peridural prévia, visualiza o LCR retornando lentamente, e apesar de não ter sentido nenhum "clique" na agulha ao furar a dura máter ou não conseguir aspirar livremente o LCR, você injeta o anestésico assim mesmo. Após 5min, não houve nenhum efeito na dor da paciente ou na sensação em MMII. Após oferecer a paciente as opções, ela opta por repetir a raquianestesia.
Na segunda tentativa, você visualiza o espaço com o ultrassom e observa um ligamento flavum a 4,6cm de profundidade (mais profundo do que a primeira punção). Novamente você visualiza o retorno do LCR em posição mais superficial, como da primeira vez, porém continua a introduzir a agulha. Você sente o clique, retira o mandril, e dessa vez consegue aspirar o fluido. Você então inejta o anestésico e a anestesia se instala perfeitamente.
O que você acha que pode ter ocorrido?
Ponto 1: a causa mais comum para um cateter de peridural que estava funcionando não mais servir é o deslocamento do cateter (a segunda, também óbvia, é desconexão do cateter ou uma bomba inadvertidamente desligada). Em pacientes obesos, o tecido subcutâneo pode mobilizar a ponta do cateter se não realizada a manobra de Cohen, deslocando o tecido subcutâneo para cima após posicionar o cateter e antes de fixar o curativo, se afastando do cateter e garantindo que o cateter tenha um trajeto maior subcutâneo, tendo maior "mobilidade" e não deslocando a ponta do espaço peridural.
Ponto 2: ao realizar raquianestesia após injeção de anestésico local no neuroeixo, sempre deve-se suspeitar da natureza do fluido que retorna na agulha - é líquor ou AL residual?
Ponto 3: é importante saber diferenciar a falha parcial, onde ocorre apenas leve dormência em pernas e períneo, da falha total, que não produz nenhum efeito. A primeira sugere que o AL está aprisionado distal na lordose lombossacra, na segunda, nenhum AL atingiu o espaço subdural.
A imagem abaixo representa o que pode ter ocorrido com a paciente do caso, assim como a representação esquemática da Manobra de Cohen.
Referências:
HADZIC, Admir. Hadzic's Textbook of Regional Anesthesia and Acute Pain Management. 2. ed. [S. l.]: McGraw-Hill Education, 2017. ISBN 978-0-07-174122-4.
ARCHER, Thomas (ed.). Obstetric Anesthesia: A CAse-Based and Visual Approach. [S. l.]: Springer, 2020. ISBN 978-3-030-26476-5.